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domingo, 19 de fevereiro de 2012

DE VOLTA

Estamos de volta, amigos!
Agora, os nossos encontros serão mais frequentes.
Neste Carnaval preferimos o descanso. Já vocês que estão a fim de esbórnia, curtam a boa, a devassa, a redonda, enfim, todas. Mas voltem para casa com cuidado e responsabilidade. Bebida e direção não se coadunam.
Evoé, Momo!

segunda-feira, 21 de março de 2011

AÇORDAS

Açordas são importante item da culinária portuguêsa, derivadas da longa presença árabe na penísula . Dos textos hodiernos sobre o tema, escolhi este, de 2007, de Virgilio Nogeira Gomes.
De seguida, como se diz em Portugal, uma receita de açorda alentejana, a mais popular da terra de Camões.

"Parece inquestionável que a açorda é uma dádiva da presença dos árabes pelas nossas terras. Parece também que a açorda é um prato de subsistência, provavelmente na sequência de crises alimentares. E a sua chegada até nós deve-se à sua facilidade de confecção e sobretudo à mistura simples de produtos de base. O pão foi sempre, e ainda é, um alimento estruturante da nossa alimentação.
Quando analisamos as fontes, receituário, da presença árabe na península encontramos muitas sopas às quais se adicionava pão esfarelado ou cortado grosseiramente. Parece ser esta a origem das açordas. No entanto quase só na zona sul do país assumimos a designação açorda. Este termo nunca aparece associado às sopas de pão que ainda hoje se confeccionam nas Beiras ou Trás-os-Montes.
E temos a grande variante da açorda, que já não é sopa, e que se transformou num prato de referência em Portugal. Ninguém abdica na zona costeira das variadas açordas de peixes e marisco.
No tratado de cozinha árabe, Kitâb-al-tabîj, dos séculos X e XI, de autor anónimo, encontramos a primeira designação de açorda. Noutro tratado, de Ibn Abd al-Ra’uf, também se refere a açorda, com a designação de Tarid [thari:d] ou Tarida, em árabe, que quer dizer pão migado, ao qual se junta alho, coentros e água quente.
Em consulta de dicionários de árabe encontramos ainda o termo Ath thurdâ, que significa sopa com pão.
Mas é no século XIII que nos surge o mais famoso tratado da época. Trata-se da obra “Fudalat al-Khiwan…” escrito por Ibn Razin Tujibi entre 1238 e 1266, e cujo título eu traduzo, a partir do francês, para “As Delícias da Mesa e os Melhores Tipos de Comida”. Neste livro há um capítulo dedicado às Panades (sopas com pão) logo de seguida ao capítulo do pão. Encontramos 25 receitas de Panades maioritariamente enriquecidas com carnes desde o frango ao capão, passando pelo pombo e borrego ou pelo cordeiro. Também aparecem três receitas de leite que terminam sempre com açúcar e canela pelo que deveriam pertencem ao grupo da doçaria. Curioso é de notar que já existia uma receita de Panade afrodisíaca.
Surpreendente é verificar, quando consultamos receituário contemporâneo dos países do Magrebe, não encontrar as famosas sopas com pão. Será pela alteração na fabricação do pão? E isto devido à influência francesa durante a primeira metade do século XX?
Parece, no entanto, que será desta prática de sopas com pão que nasceram, e se transformaram, as nossas açordas.
Como referi no início o pão, ainda hoje, é um elemento estruturante da nossa alimentação. E no passado o pão teria que ser consumido na sua totalidade pelo seu valor de apoio permanente ao consumo. A sua aplicação na sopa seria uma forma de utilizar o pão mais velho e mais seco. Seria a sua absorção integral.
Encontramos em Gil Vicente possivelmente a primeira designação de açorda, na Farsa dos Almocreves: “Tendes uma voz tão gorda/ que parece alifante/ depois de farto de açorda”. E ainda não havia os actuais conceitos de estética do corpo, que hoje temos!
Todos sabemos que as sopas eram pratos de importância e capazes de fazer uma refeição completa e o pão cumpria bem a missão de a fazer engrossar. A castanha tinha utilização regional e a batata ainda estava longe de aparecer.
No primeiro livro de cozinha impresso em Portugal, de Domingos Rodrigues, “A Arte de Cozinha…”, em 1680, é feita uma clara distinção entre caldos e sopas, sendo que estas eram sempre confeccionadas com pão, ou este adicionado no final. Algumas vezes, e seria designação corrente, chamavam sopas às fatias de pão sobre as quais se colocavam produtos cozinhados especialmente carnes. Também Domingos Rodrigues nos apresenta três sopas doces, sempre com pão e açúcar e canela.
No livro que em seguida se publicou em Portugal, de Lucas Rigaud, “Cozinheiro Moderno, ou Nova Arte de Cozinha…”, em 1780, e com uma preocupação mais elitista da cozinha e a tentativa de instalação da moda francesa, não deixa de referir várias sopas iniciando a confecção da maioria com a preparação do pão. É pois constante que a designação de sopa esteja sempre associada ao pão.
Não encontrei a palavra açorda nestes nossos primeiros dois livros. Será que o termo estava destinado às confecções domésticas?
Em 1876 publica João da Mata o seu “Arte de Cozinha” especialmente destinado aos profissionais. Encontramos aqui a açorda com bacalhau, uma sopa de pão à portuguesa e ainda outras sopas com pão. A açorda aqui receituada não é uma sopa mas uma açorda muito semelhante às que hoje encontramos. Este livro entra com facilidade no século XX e será o manual dos profissionais da época.
Mas é com Carlos Bento da Maia, edição de 1904, com o título “Tratado Completo de Cozinha e Copa”, que as açordas aparecem como confecção culinária e ilustradas com onze receitas, e fazendo bem a separação das muitas sopas com pão. Estamos na época do aparecimento de restaurantes, e a cozinha regional começa a evidenciar-se. Continua a haver, no entanto, um espírito de copiar a cozinha francesa dado que apenas esta é assumida como alta cozinha.
A presença da cozinha regional portuguesa, nos restaurantes, é assumidamente um acto positivo a partir dos anos 40. A imposição legal de nas Pousadas de Portugal, inauguradas a partir de 1942, ser obrigatoriamente servida cozinha regional, e projectadas como locais de elite, levou muitos restaurantes a seguir o seu exemplo. Em 1936 publica-se o livro “Culinária Portuguesa”, de António Maria de Oliveira Bello no qual é verdadeiramente feito o elogia e defesa da cozinha regional, onde são apresentadas sete receitas de açorda. Já mesmo autor tinha publicado no livro “Culinária”, 1928, uma receita de Açorda de Alhos à Portuguesa enquanto sopa à base de pão, sobre a qual se colocava ovos estrelados preparados à parte, ou ovos escalfados… Será a partir desta receita que nos aparece a “açorda à alentejana”, que enquanto açorda é a única sopa do nosso receituário regional?
Em 1940 publica-se o livro “Volúpia” de Albino Forjaz de Sampaio, e na minha opinião o primeiro livro de gastronomia em Portugal. O autor na sua descrição do Portugal Gastronómico lá refere a açorda, e apresenta mesmo uma receita em verso do poeta José Inácio de Araújo: “Açorda Portuguesa”, que classificada de invenção portuguesa, alimento fortificante e capaz de ter derrotado os mouros.
Mas qual é a realidade das açordas na cozinha portuguesa? Primeiro temos a açorda/sopa de que a Açorda Alentejana é o melhor exemplo. Depois a glorificação das açordas como prato completo e a imensa variedade de receituário desde o Douro, toda a costa atlântica com peixes e mariscos, da Beira ao Alentejo com o bacalhau, e o Alentejo com as carnes de porco e enchidos. Temos ainda o conceito de açorda como guarnição, ou complemento, de que saboreamos o excelente exemplo com sável e respectiva açorda de ovas. E teremos sempre açordas maravilhosas enquanto mantivermos a qualidade do nosso pão. Podem-se criar novas receitas, e mais inventivas. Pode molhar-se o pão com canja de galinha e misturar depois o marisco. O que não pode ser alterado é o nosso pão.
Forçados seremos a alterar pequenos comportamentos de acabamento de algumas açordas, a exemplo da foto ilustrativa. O prazer de vermos misturar a gema de ovo crua não será mais possível por questões de segurança alimentar. Que pena!

Observação ! Findo o texto de Virgilio, cabe a mim dizer que a açorda é, fora do Alentejo, o prato mais conhecido da culinária alentejana. Vai à mesa do pobre e do rico e raro é o dia que não constitui o almoço do trabalhador rural.
Tem muitas variantes, mais influenciadas pela mudança de estações do que, como é regra em cozinha trdicionais, de terra para terra.
É sempre um caldo quente e transparente, aromatizado com coentros ou poejos, ou os dois, alhos pisados com sal grosso e condimentado com azeite.
Dão-lhe consistência fatias ou bocados de pão de trigo, de preferência caseiro e duro.
Acompanha-se geralmente com ovos escalfados, que também podem ser cozidos, e azeitonas.
Muitas vezes, na água utilizada já se cozeu uma posta de pescada ou de bacalhau.
Também pode ser acompanhada com sardinhas assadas ou fritas e, no Outono, é muitas vezes
enriquecida com tiras finas de pimentão verde, que se escaldam com a água ao mesmo tempo que as ervas, e acompanhada com figos maduros ou um cacho de uvas brancas de mesa.

Hoje em dia, contudo, em especial fora do Alentejo, encontram-se açordas várias, até mesmo de presunto ibérico.

BOM APETITE!

Receita de Açorda Alentejana.

Ingredientes: Para 4  pessoas


  • 1 bom molho de coentros (ou um molho pequeno de poejos ou uma mistura das duas
    ervas
  • 2 a 4 dentes de alho
  • 1 colher de sopa bem cheia de sal grosso
  • 4 colheres de sopa de azeite
  • 1,5 litro de água a ferver
  • 400 grs de pão caseiro (duro)
  • 4 ovos
Confecção:

Pisam-se num almofariz, reduzindo-os a papa, os coentros (ou os poejos) com os dentes de alho, a que se retirou o grelo, e o sal grosso.
Deita-se esta papa na terrina ou numa tigelade meia cozinha, que neste caso fará ofícios de terrina.
Rega-se com o azeite e escalda-se com a água a ferver, onde previamente se escalfaram os ovos (de onde se retiraram).
Mexe-se a açorda com uma fatia de pão grande, com que se prova a sopa.
A esta sopa dá-se o nome de sopa «azeiteira» ou «sopa mestra».
Introduz-se então no caldo o pão, que foi ou não cortado em fatias ou em cubos com uma faca, ou partido à mão, conforme o gosto.
Depois, tapa-se ou não a açorda, pois uns gostam dela mole e outros apreciam as suas sopas
duras.
Os ovos são colocados no prato ou sobre as sopas na terrina, também conforme o gosto.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Para variar

Recebi por e-mail e repasso,para variar.

Pergunta: Alguém sabe me explicar, num português claro e direto, sem
figuras de linguagem, o que quer dizer a expressão "no frigir dos
ovos"?

Resposta:

Quando comecei, pensava que escrever sobre comida seria sopa no mel,
mamão com açúcar. Só que depois de um certo tempo dá crepe, você
percebe que comeu gato por lebre e acaba ficando com uma batata quente
nas mãos. Como rapadura é doce mas não é mole, nem sempre você tem
idéias e pra descascar esse abacaxi só metendo a mão na massa.

E não adianta chorar as pitangas ou, simplesmente, mandar tudo às favas.

Já que é pelo estômago que se conquista o leitor, o negócio é ir
comendo o mingau pelas beiradas, cozinhando em banho-maria, porque é
de grão em grão que a galinha enche o papo.

Contudo é preciso tomar cuidado para não azedar, passar do ponto,
encher linguiça demais. Além disso, deve-se ter consciência de que é
necessário comer o pão que o diabo amassou para vender o seu peixe.
Afinal não se faz uma boa omelete sem antes quebrar os ovos.

Há quem pense que escrever é como tirar doce da boca de criança e vai
com muita sede ao pote. Mas como o apressado come cru, essa gente
acaba falando muita abobrinha, são escritores de meia tigela, trocam
alhos por bugalhos e confundem Carolina de Sá Leitão com caçarolinha
de assar leitão.

Há também aqueles que são arroz de festa, com a faca e o queijo nas
mãos, eles se perdem em devaneios (piram na batatinha, viajam na
maionese... etc.). Achando que beleza não põe mesa, pisam no tomate,
enfiam o pé na jaca, e no fim quem paga o pato é o leitor que sai com
cara de quem comeu e não gostou.

O importante é não cuspir no prato em que se come, pois quem lê não é
tudo farinha do mesmo saco. Diversificar é a melhor receita para
engrossar o caldo e oferecer um texto de se comer com os olhos,
literalmente.

Por outro lado se você tiver os olhos maiores que a barriga o negócio
desanda e vira um verdadeiro angu de caroço. Aí, não adianta chorar
sobre o leite derramado porque ninguém vai colocar uma azeitona na sua
empadinha, não. O pepino é só seu, e o máximo que você vai ganhar é
uma banana, afinal pimenta nos olhos dos outros é refresco...

A carne é fraca, eu sei. Às vezes dá vontade de largar tudo e ir
plantar batatas. Mas quem não arrisca não petisca, e depois quando se
junta a fome com a vontade de comer as coisas mudam da água pro vinho.

Se embananar, de vez em quando, é normal, o importante é não desistir
mesmo quando o caldo entornar. Puxe a brasa pra sua sardinha, que no
frigir dos ovos a conversa chega na cozinha e fica de se comer
rezando. Daí, com água na boca, é só saborear, porque o que não mata
engorda.

quarta-feira, 9 de março de 2011

"Família é prato difícil de preparar"

Recebi de amiga muito querida - e tímida- uma saborosa contribuição que repasso desejando que todos também a saboreiem.

"Família é prato difícil de preparar"
(de "O Arroz de Palma, de Francisco Azevedo)

Família é prato difícil de preparar. São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema, principalmente no Natal e no Ano Novo. Pouco importa a qualidade da panela, fazer uma família exige coragem, devoção e paciência. Não é para qualquer um. Os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir. Preferimos o desconforto do estômago vazio. Vêm a preguiça, a conhecida falta de imaginação sobre o que se vai comer e aquele fastio. Mas a vida, (azeitona verde no palito) sempre arruma um jeito de nos entusiasmar e abrir o apetite. O tempo põe a mesa, determina o número de cadeiras e os lugares. Súbito, feito milagre, a família está servida. Fulana sai a mais inteligente de todas. Beltrano veio no ponto, é o mais brincalhão e comunicativo, unanimidade. Sicrano, quem diria? Solou, endureceu, murchou antes do tempo. Este é o mais gordo, generoso, farto, abundante. Aquele o que surpreendeu e foi morar longe. Ela, a mais apaixonada. A outra, a mais consistente.

E você? É, você mesmo, que me lê os pensamentos e veio aqui me fazer companhia. Como saiu no álbum de retratos? O mais prático e objetivo? A mais sentimental? A mais prestativa? O que nunca quis nada com o trabalho? Seja quem for, não fique aí reclamando do gênero e do grau comparativo. Reúna essas tantas afinidades e antipatias que fazem parte da sua vida. Não há pressa. Eu espero. Já estão aí? Todas? Ótimo. Agora, ponha o avental, pegue a tábua, a faca mais afiada e tome alguns cuidados. Logo, logo, você também estará cheirando a alho e cebola. Não se envergonhe de chorar. Família é prato que emociona. E a gente chora mesmo. De alegria, de raiva ou de tristeza.


Primeiro cuidado: temperos exóticos alteram o sabor do parentesco. Mas, se misturadas com delicadeza, estas especiarias, que quase sempre vêm da África e do Oriente e nos parecem estranhas ao paladar tornam a família muito mais colorida, interessante e saborosa.
Atenção também com os pesos e as medidas. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto, é um verdadeiro desastre. Família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido. Outra coisa: é preciso ter boa mão, ser profissional. Principalmente na hora que se decide meter a colher. Saber meter a colher é verdadeira arte. Uma grande amiga minha desandou a receita de toda a família, só porque meteu a colher na hora errada.
O pior é que ainda tem gente que acredita na receita da família perfeita. Bobagem. Tudo ilusão. Não existe Família à Oswaldo Aranha; Família à Rossini, Família à Belle Meunière; Família ao Molho Pardo, em que o sangue é fundamental para o preparo da iguaria. Família é afinidade, é a Moda da Casa. E cada casa gosta de preparar a família a seu jeito.
Há famílias doces. Outras, meio amargas. Outras apimentadíssimas. Há também as que não têm gosto de nada, seriam assim um tipo de Família Dieta, que você suporta só para manter a linha. Seja como for, família é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Uma família fria é insuportável, impossível de se engolir.


Enfim, receita de família não se copia, se inventa. A gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e transmitindo o que sabe no dia a dia. A gente cata um registro ali, de alguém que sabe e conta, e outro aqui, que ficou no pedaço de papel. Muita coisa se perde na lembrança. Principalmente na cabeça de um velho já meio caduco como eu. O que este veterano cozinheiro pode dizer é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, família é prato que você tem que experimentar e comer. Se puder saborear, saboreie. Não ligue para etiquetas. Passe o pão naquele molhinho que ficou na porcelana, na louça, no alumínio ou no barro. Aproveite ao máximo. Família é prato que, quando se acaba, nunca mais se repete.

"Se tivéssemos consciência do quanto nossa vida é passageira,
talvez pensássemos duas vezes antes de jogar fora as oportunidades
que temos de ser e de fazer os outros felizes."

segunda-feira, 7 de março de 2011

MAHALIA JACKSON ~ Jesus Met The Woman At The Well

NADA MELHOR QUE MAHALIA JACKSON PARA NOS EXPURGAR DA MÚSICA CARNAVALESCA ATUAL BRASILEIRA. AMANHÃ, TERÇA-FEIRA GORDA, VAMOS VERSAR SOBRE AS COMIDAS DE CARNAVAL.

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